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MAESTRO HENRIQUE SANTOS E SILVA

Por José Manuel d’Oliveira Vieira
(Artigos Autor publicados Jornal de Alferrarede nºs 262AGO2007 e 268FEV2008 - alterados para blog)


RECUPERAÇÃO DE UM ESPÓLIO

Estavam destinados ao maior arquivo do Concelho de Abrantes, a “lixeira”.
Não tivessem sido resgatados a tempo, documentos considerados importantes na vida do Maestro Henrique dos Santos Silva e “Orfeon Abrantino Pinto Ribeiro” estariam hoje reciclados, prontos para um novo ciclo. Destinado à profissão de relojoeiro, aprendiz aos 20 anos de idade (assim escreveu seu pai num documento de recenseamento em 1920), este cidadão Abrantino cedo dedicou a sua mestria às artes, levando a que a “Cidade Florida”, fosse conhecida dentro e fora das nossas fronteiras.Filho de Alfredo Alves da Silva *, também ele ligado ao “Orfeon Abrantino” e de Delmira da Piedade dos Santos, Henrique dos Santos e Silva, nasceu no dia 18 de Setembro de 1910, na Freguesia de S. João Batista, Concelho de Abrantes. Depois de tanto ter dado à sua terra (06 Janeiro de 1934 até á data da sua morte 30 de Janeiro de 1981), ser recordado numa “Sala Museu” é a melhor forma de perpetuar a sua memória.
Depois de tudo já ter sido escrito e dito do Maestro, quem foi, o que fez, onde actuou, nada mais resta senão justificar a razão porque se escreve mais uma vez deste distinto músico, que durante meio Século foi reconhecido no meio musical do país. João Augusto, sabendo o interesse que tenho por velhos papéis, levou-me ao interior da casa que viu nascer o mestre Henrique. No chão, no meio de jornais sem interesse e em velhos baús apodrecidos pelo tempo, envoltos em muito pó, encontrei um pouco mais da história do “Velho Orfeon” e dos seus bastidores.Documentos e objectos pessoais do Maestro, óculos, caneta e isqueiro personalizados a centenas de partituras e manuscritos sobre o “Orfeon Pinto Ribeiro”, alguns gracejos políticos da vida Abrantina (escritos e impressos) vividos na época, de tudo um pouco foram encontrados.
Das muitas peças recuperadas ao lixo, destacam-se as operetas: “A Herança do Capitão-mor” e o “Milhafre” que ficaram na memória de quem assistiu e actuou no antigo “Orfeon”.
Um “Hino Marcha”, dedicado aos “Combatentes da Grande Guerra de Abrantes” e destinado a realizar fundos para o futuro Monumento aos Mortos da Grande Guerra é outra das peças encontradas. Várias são as partituras especialmente escritas e assinadas pelo Maestro Pinto Ribeiro, em exclusivo para o “Orfeão”.
Programas de espectáculos e recortes de Jornais da época (1929/1936) mostram quanto o Maestro Henrique Santos Silva deu em prol da cultura a esta terra.Num dos livros, onde constam os adereços e material destinado às peças de teatro que se realizavam com assiduidade em Abrantes (Cine Teatro da Misericórdia e Teatro Taborda), fica-se a saber ter existido um cenário com a Praça de Touros de Alferrarede (Quinta do Bom Sucesso), feito pelo pintor Abrantino José Paulo Fernandes Júnior, que provavelmente se encontrava no Teatro Taborda. Não sendo este espólio de desprezar, muito menos será “uma salva de prata do Orfeão Pinto Ribeiro ao Regente H.S.S. do Grupo Coral 6-XII-51”, “uma batuta inteiramente de prata dos “Antigos Orfeonistas do Maestro H.S.S. na reaparição do Orfeão Abrantino Pinto Ribeiro 6-XI-951”, “uma cigarreira de prata personalizada com o nome Henrique”, “uma cigarreira (porta tabaco) de prata personalizada com o monograma HS”, “um porta batuta e batuta de madeira”, “uma batuta de madeira com o punho de prata com a inscrição H.S.S. 25-XII-935”, “duas batutas normais”, lamirés, um “valioso” violino, com etiqueta original do fabricante Italiano “Nicolaus Amatus – Fecit – In Cremona 1646” (ver caixa - "O VIOLINO"), este, o mais eminente membro da família “Amati” (1596-1684), ao qual consta ter tido como aluno, António Stradivarius (1644-1737), o mais célebre construtor de violinos de todos os tempos.De todo este espólio sobressai igualmente, uma profusa e valiosa colecção de discos em vinil, de música clássica, que eram para o Maestro a “menina dos seus olhos”. Mostrando interesse neste espólio (após proposta), a Vereadora da Cultura Dr. Isilda Jana, envidou esforços para que documentos e objectos pessoais do Maestro, dispersos em três locais diferentes, fossem entregues pelos doadores, D. Maria Manuela de Jesus Campos, Maria Fernanda Janeiro, João Augusto e José Manuel d’Oliveira Vieira, o que aconteceu no dia 24 de Janeiro de 2008. De real importância, o espólio agora entregue ao Director da Biblioteca António Botto, Dr. Francisco Lopes – Arquivo Histórico de Abrantes, composto por peças únicas, depois de inventariado e catalogado por pessoal especializado do A.H.C.A. será, apresentado em sessão pública.
Com esta iniciativa, Abrantes que já deu o nome do distinto Maestro Henrique Santos Silva a uma Rua da cidade, verá assim salvaguardada uma parte importante do seu espólio.Além das peças já referenciadas, foi ainda oferecido à Biblioteca de Abrantes, uma colecção de bengalas e dois álbuns “orientais”, com fotos e postais raríssimos, que foram pertença do pai do maestro, Alfredo Alves da Silva, também ele ligado ao “Orfeon Abrantino” como dirigente e coralista durante muitos anos. Álbuns, fotos e postais, referem-se aos anos 1900/1901 e 1905/1907, quando Alfredo Alves da Silva esteve em Macau e França (I Grande Guerra).
Em falta fica a peça que mais gozo dava ao distinto maestro: o Piano.
Devolvido à comunidade, todo este espólio irá servir para comemorar o aniversário do nascimento do Maestro, que se fosse vivo faria 100 anos no dia 18 de Setembro de 2010.
*Numa velha agenda Alemã, Alfredo Alves da Silva (pai do Maestro), descreve relatos diários dos bombardeamentos recíprocos, durante a I Grande Guerra, na fronteira a Norte de Moçambique (Rio Rovuma), entre Portugueses e Alemães. Este diário e cartas, por serem inéditos e escritos por um militar da Guarnição de Abrantes, sócio nº 133 da Liga dos Combatentes da Grande Guerra de Abrantes. Em tempo oportuno irão estes relatos de guerra ser publicadas numa página de “COISASD’ABRANTES”.
"O VIOLINO"
Não tocava um violino Stradivarius, no entanto, a forma como o Maestro fazia eclodir o peculiar som ao seu violino “Nicolaus Amatus – Fecit - In Cremona 1646” é descrito assim por A. Santos no "Jornal de Abrantes nº 4884, pág. 7 de 28-3-97":
“Henrique Santos e Silva, como violinista era um executante que pedia meças a qualquer bom profissional. Por isso, foi convidado para primeiro violino da então grande Orquestra da Emissora Nacional. Mas quê, sair de Abrantes? Nem pensar. E assim se perdeu um elemento de grande valor.
Alves Coelho (filho), inspirado e famoso compositor, era um pianista espectacular (despia e vestia o casaco a tocar piano), mas não era um pianista clássico para poder acompanhar correctamente o violinista sério que era Henrique Silva e este dizia-me que nunca se sentira tão envergonhado por causa do acompanhamento que tivera”
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