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HISTÓRIA MILITAR DE ABRANTES (XIV)

Por José Manuel d’Oliveira Vieira

1827
FEVEREIRO 7/8/19: Brigadeiro Governador Interino da Praça de Abrantes, António Feliciano Telles de Castro Aparício, por requisição do Hospital da Santa Casa da Misericórdia de Abrantes, entrega à Santa Casa, 25 barras, 50 enxergas, 50 cabeçalhos, 100 camizas, 200 lanções, 50 mantas, 50 cobertores, 100 barretes, pertencentes aos Hospitais Regimentais de Infantaria Nº 10 e 20, para serviço dos enfermos militares, na importância de cento e noventa oito mil setecentos e trinta reis, a deduzir na despesa do tratamentos dos militares ali internados. Na relação de entrega consta o nome dos irmãos da Santa Casa que receberam o referido material11.
 AHM
FEVEREIRO 25: Vindo de Elvas, em marcha para o Quartel do Tenente General Clinton,  chega a esta Praça o Tenente Coronel do Real Corpo de Engenheiros de Sua Majestade Britânica, John Fox Burgoyne*. Durante a sua permanência na Vila de Abrantes, Governador António de Azevedo Coutinho, facilita a Burgoyne, revista ás fortificações da Praça de Abrantes11
*Em 1826 acompanhou o General Henry Clinton numa missão a Portugal para apoiar o Governo Constitucional contra as forças absolutistas de D. Miguel. 
 
Ten.Cor.Engº John Fox Burgoyne
(1782-1871)
MARÇO 17/19: António de Azevedo Coutinho, informa o Ministério da Guerra, ter chegado à Praça de Abrantes (17 MARÇO), com destino a Portalegre (19 MARÇO), o Tenente Coronel Burgoyne, cheffe de Engenheiros, e o Capitão Clinton, Ajudante de Ordens, e Filho do General Clinton, do Exercito de Sua Magestade Britanica11. 
MARÇO 22: Para evitar que Desertores Armados ou outros Inimigos fação alguma incursão, e se apoderem das Barcas, João da Silveira de Lacerda, Governador das Armas da Beira Baixa manda vigiar barcas do Tejo e Ponte na Amieira11
MARÇO 30: Entrou na Praça de Abrantes o General Comandante em Chefe das tropas aliadas, Guilherme Henrique Clinton* , Coronel Quartel Mestre General, Owar e o Capitão Franciosi. Foram recebidos com todas as honras militares, mostradas as fortificações conforme o recomendado “pelas Ordens do Dia Nºs 4 e 8 dos dias 5 e 15 de Janeiro do ano corrente”, fez o reconhecimento às posições do “Codis”. Retiram no dia 1 de Abril em direcção à sua posição e ponte de “Punhete” 11. 
*Como Coronel do Exército Britânico participou na captura da Madeira e foi seu Governador desde Julho de 1801 a Março de 1802. A presença do General Comandante em Chefe das Tropas Aliadas, Guilherme Henrique Clinton e as visitas constantes à Praça de Abrantes dos Engenheiros Britânicos revela o quanto Abrantes continuava a ser um ponto importante e estratégico para a defesa do Reino na esperada invasão espanhola.
Wiliam Henry Clinton
ABRIL 9: Para reconhecimento das colinas e posições no circuito de Abrantes, entram nesta Praça o Coronel Burgoyne do Corpo de Engenharia do Exército Britânico e o Capitão Clinton, Ajudante de Ordens do General em Chefe11
ABRIL 12: Para inspeccionarem e verem o estado da Praça, chegaram a esta Vila onde pernoitam e partem no dia seguinte para o Quartel-general em Leiria, o Capitão Bally, Ajudante de Ordens do General em Chefe (Guilherme Henrique Clinton), o Inspector dos Hospitais (Rooliche) e o Pagador General Craufurd11. 
MAIO 22: Numa extensa carta (confidencial), a partir de Abrantes, Francisco de Paula Biquer*, Coronel do 7º Regimento de Infantaria, denuncia ao Ministro da Guerra, Duque de Saldanha (João Carlos de Saldanha Oliveira e Daun), vários oficiais e um ajudante de cirurgia por desafectos ao actual sistema de governo, que tão feliz, e venturosamente nos rege… Na mesma carta é referido que os mesmos oficiais querem fazer lavrar, e correr as doutrinas subversivas…11 (Ver MAIO 30)
*Por atentar contra a soberania, três meses depois, este Coronel é mandado julgar em Conselho de Guerra (ver AGOSTO 29).
MAIO 30: Coronel do 7º Regimento de Infantaria, Francisco de Paula Biquer, solicita ao Duque de Saldanha que os seus militares quando chegarem à Capital não comunicarem com os soldados deste Regimento que se encontram presos no Castelo de S. Jorge por serem inimigos da Carta Constitucional outorgada por D. Pedro IV11.
-De Janeiro a Maio, 109 militares, recrutas, do 7º Regimento de Infantaria estacionado nesta Praça, que se encontravam no Depósito de Setúbal desertaram11
JUNHO 14: Vários oficiais e um bacharel em leis, não possuidores de guias nem passaporte, foram presos pelo Capitão-mor e Juiz Ordinário do Gavião e remetidos para a Praça de AbrantesAG335
JUNHO 19: Por decreto, nesta data foi desonerado do Governo da Praça de Abrantes o Brigadeiro António de Azevedo Coutinho. Pelo mesmo decreto passa a Governador da Praça de Abrantes, Brigadeiro João Vasconcelos de SáAG335.
-Organizado o Hospital Militar no Convento de S. Domingos.
DSE 
JUNHO 23/24: Um tenente e um alferes, ambos do Regimento de Infanatria Nº 8, presos, acusados da fuga do Espanhol D. Alonço Barrantes da prisão da Casa da Câmara de Abrantes, foram absolvidos, soltos e entregues ao exercício dos seus deveres e patentesAG335(ver AGOSTO 27).  
JULHO 18: Abrantes -Ponte de barcas e cavaletes - Planta de Joze Carlos de Figueiredo, Tenente Coronel Engenheiro; desenhado por Angelo Centazzi, 2º Tenente do Real Corpo de Engenheiros.
DSE
JULHO 27: Cavalo e objectos de emigrados “Hespanhoes” são apreendidos e entregues ao Ajudante do Quartel-general de Abrantes, José Joaquim de Brito a Joaquim da Costa Ribeiro11. 
AGOSTO 27: Por Decreto do corrente mês, Governador da Praça de Abrantes o Brigadeiro António de Azevedo Coutinho em substituição do Brigadeiro João de Vasconcelos e Sá que foi para a Praça de ElvasAG335.
-Nesta mesma data é reposta a reputação do Brigadeiro Coutinho, por ser acusado de negligência e fuga de um espanhol preso na “Casa da Câmara de Abrantes”AG335. 
AGOSTO 29: Manda a Senhora Infanta Regente, em nome de El-Rei que faça julgar em Conselho de Guerra o Coronel do Regimento de Infantaria Nº 7 Francisco de Paula Biquer e mais dois oficiais do mesmo RegimentoAG335
SETEMBRO 11:  Era nesta data Tenente Rey da Praça de Abrantes o Coronel Coronel Graduado Antão Garcez Pinto de MadureiraAG308.
DEZEMBRO 12: (Pontes Militares) – Obra de José Carlos de Figueiredo em Anexo (1).
Orçamento* para construção de dois armazéns na margem direita do Rio Tejo em Abrantes -
A experiencia de todas as Campanhas passadas nos tem mostrado quanto a Villa de Abrantes se torna interessante pela sua posizão topográfica, ou seja considerada como Logar forte/e nesse cazo/contendo em si grandes Depozitos; ou pela segur -a comunicação que então se estabelece entre as duas Provincias de Alemtejo, e Beira Baixa por meio de huma Ponte Militar lançada sobre o Tejo debaixo da protecção das suas obras avançadas.
Hé debaixo deste ponto de vista que se pode ajuizar quão vantajoso, e necessaário será o proceder-se á construção de hum Edificio próprio… de poder guardar em competente arrecadação… e a de servir de Depozito geral de utensílios de outras Pontes que se pretendão lançar sobre o Tejo, e Zêzere… Quartel em Abrantes 12 de Dezembro de 1827 – José Carlos de Figueiredo – Ten Coronel Engenheiro11 (Ver MAIO 31 de 1828). 
*Orçamento descritivo com todos os pormenores para a sua construção, em doze (12) folhas, incluindo a planta do referido edificioDSE.
DSE
Planta – Armazéns Trem Pontes Militares em Abrantes
Nota: Está esta planta classificada na DSE como o ano de 1800. É de crer haver falha de classificação e ser de 1827 e não de 1800  uma vez que a referida planta se encontra anexada a este orçamento do  Engenheiro José Carlos Figueiredo.
Anexo (1)
Figueiredo (José Carlos de)
Nasceu em Lisboa. Por decreto de 3 de novembro de 1802 foi promovido a 1º tenente do Real Corpo de En­genheiros, sendo 2º tenente, por serviços presta­dos em campanha; não encontramos noticia das outras promoções d'este engenheiro, até ao posto de tenente coronel em 1827; a coronel graduado foi promovido em 6 de agosto de 1832, a effectivo em 25 de setembro de 1833, e a brigadeiro gra­duado em 18 de janeiro de 1842, contando a an­tiguidade desde 5 de setembro de 1837.
Em 1827 desempenhou um papel importante na construcção de pontes permanentes sobre o Tejo, para serem aproveitadas na guerra, escrevendo sobre o assumpto a sua:
Memoria descriptiva dos serviços feitos pelos officiaes e destacamento de artifices engenheiros, debaixo do meu commando, na Commissão das Pontes para a guerra; das Baterias destinadas para sua defeza; e das estradas militares. —1827.
D’esta memoria, existente no Archivo de Enge­nharia, e publicada na Revista de Engenharia Mi­litar de março do anno de 1903, resumimos o se­guinte:
José Carlos de Figueiredo, que devia ser então major de engenheiros, marchou com um destaca­mento de artifices engenheiros, incluindo um ca­pitão e dois subalternos, cm 15 de dezembro de 1826 para Abrantes, para dar principio ás pontes permanentes sobre o Tejo. Em 28 d’esse mez estava prompta a servir a ponte de Villa Velha no porto d´esta villa, sendo porém desorganizada logo a seguir pela approximação de um corpo de tropas inimigas, e estabelecida outra ponte na Amieira por este ponto poder ser melhor defen­dido.
Emquanto esta ponte se construia, marchou o T.te C.el Figueiredo, com os tenentes José Manço de Faria e José Maria Moreira de Bergara, para Niza (5 de janeiro de 1837) afim de fazerem um reconhecimento na Fronteira e abrir eommunicações que facilitassem a observação dos movimentos do inimigo. Concluido esse reconhecimento, levado a effeito num dia pelos referidos tenentes, recolhe­ram em 7 á villa da Amieira, cuja ponte ficou concluida em 10, recolhendo o destacamento em 15 a Abrantes, para apparelhar o necessário para as pontes de Abrantes e Punhete.
Em portaria de 18 foi mandado lançar a ponte sobre o Zezere em Punhete, para facilitar a passa­gem das tropas britanicas que nesse dia começa­ram a sahir da capital. Marchou o destacamento para aquella villa em 22, e ás 10 horas do dia se­guinte ficava concluida a construcção da ponte em toda a largura do rio, que era de 335 palmos, con­tinuando porém nos dias seguintes a ampliação da mesma até attingir 540 palmos, para a ponte po­der servir nas maiores cheias que sobreviessem, ficando tudo prompto em 30 de janeiro, para o que o referido T.te C.el Figueiredo usou d’um systema novo de sua invenção, que descreveu.
Em março esteve o General Clinton em Abran­tes, onde o T.te C.el Figueiredo lhe assegurou e mostrou que, se no dia seguinte elle tivesse que passar as suas tropas pelo Tejo naquella villa, a ponte estava prompta a lançar-se de forma a poder faze-lo, o que lhe fez ver mostrando-lhe todos os barcos e trem respectivo “em acção de executar promptamente o que lhe promettia. Convencido d’esta verdade, S. Ex.a me fez publicos elogios, declarando que não esperava que tanta obra estivesse concluída em tão pouco tempo”.
Recebendo ordem para o lançamento d’esta ponte em frente de Abrantes, escolheu «o dia 29 de abril em que o Senhor D. Pedro IV decretou a Carta Constitucional, para solemne e militarmente fazer esta operação, imaginando o inimigo na mar­gem esquerda d’aquelle rio, para se oppor ao es­tabelecimento da ponte, o qual se figurou ser des­alojado por 4 peças de artilharia de calibre 6, que jogavam de differentes posições da margem direita, e picado pela rectaguarda por dois corpos de artí­fices, de 60 bayonetas cada hum, que passarão o Tejo em dois difíerentes pontos; manobra que ser­viu para cobrir os trabalhos que foram necessarios para formar a ponte, no que se gastaram duas ho­ras.
Alem das pontes do Tejo e Zezere, tambem se construíram 3 pontelhões de pinheiros unidos, dois na estrada real, entre Rio de Moinhos e Abrantes, sendo um na Ribeira dos Moinhos, e outro na Ribeira Velha; e na estrada entre Punhete e Tancos na Ribeira da Fonte Santa.
Inventou uma ponte volante para seguir qual­quer corpo do exercito, e descreve-a largamente.
Sendo contrario á causa de D. Miguel, teve que imigrar para Inglaterra, sendo demittido por de­creto de 3 de fevereiro de 1831, por desertor, ficando sujeito a responder no Juízo competente pelos crimes em que se achava incurso. Mas em virtude do decreto de 24 de novembro d’esse anno foram-lhe anunlladas as notas de deserção e de­missão.
Apresentou-se na Ilha Terceira em 11 de junho de 1831, prestando relevantes serviços na defeza d'esta ilha, pelo que foi graduado em tenente co­ronel; em seguida tomou parte no cerco da cidade do Porto, onde dirigiu as fortificações de dois districtos da linha do Norte, ficando depois inspector geral de todas as fortificações das linhas ao Norte e Sul da mesma cidade.
Até outubro de 1834 era também no Porto ins­pector das Obras militares, sendo então substituido neste cargo pelo coronel de engenheiros José Dionisio da Serra, ficando só com os cargos dos tra­balhos topographicos e da manutenção das fortifi­cações das linhas do Porto. Foi nomeado mais tarde governador da praça de Elvas.
Foi comprehendido na convenção de Chaves por ter feito opposiçâo á revolução de Setembro, e ficou fora do quadro effectivo do exercito, ao qual voltou por decreto de 4 de abril de 1838, sendo depois mandado servir no ministério do Reino como commissario do governo na fiscalisaçao do contracto da nova estrada de Lisboa ao Porto, commissão que terminou, com o engenheiro Francisco Pedro de Arbués Moreira, em 22 de agosto de 1840.
D’este official, encontramos os seguintes traba­lhos topographicos no gabinete de desenho do Archivo de Engenharia:
-Planta do Castello de Monforte reedificado na campanha de 1801 por ordem de Gomes Freire, de­baixo da inspecção do 2º tenente engenheiro, Eugenio Carlos de Figueiredo, cuja planta levantou e desenhou em 20 de junho de 1801 (arm. 7, gav. 2, pasta l, nºs 54 e 55).
-Planta do Porto da Amieira onde se notam as posições da Ponte Militar, e duas Baterias para a sua defeza, 1828. Copia feita em 1829 (arm. 4, gav. 2, pasta 4, n.° 6).
Falleceu no dia 12 de setembro de 1843AG316.
Fontes:
-AHM
-AG335
-AG308
-AG316
-Gravura de William Henry Clinton em: http://en.wikipedia.org/wiki/William_Henry_Clinton
-Planta DSE – Abrantes - Ponte de barcas e cavaletes - Planta de Joze Carlos de Figueiredo
-Planta DSE – Abrantes - Armazéns Trem Pontes Militares