Água! A milenar luta dos povos para obtenção de tão precioso líquido não é de hoje.
Devido à sua posição geográfica e à falta de fontes de água potável em quantidade, Abrantes também lutou para superar a secular escassez de água potável que afligia os seus habitantes.
A queda do partido regenerador em 18 de Setembro de 1890, as condições especiais em que o país se encontrava a pretexto dos limites da costa Oriental de África celebrado com a Inglaterra, além de outras dificuldades, quase foram a causa para não haver água canalizada na “Praça Vila” de Abrantes em 1891.
Rua D. Afonso Henriques - Cortejo
Apesar dos atritos e maquinações (próprias da época), foi o deputado regenerador Avelar Machado a conseguir as verbas e o Capitão Engenheiro Monteiro de Lima autor do projecto e fiscal das obras, os principais responsáveis pelo mais importante melhoramento até então realizado em Abrantes na última década do Século XIX.
Para celebrar o acontecimento, no dia 27 de Setembro de 1891, foi divulgado o programa dos festejos a realizar nos dias 10, 11 e 12 de Outubro.
Praça Raimundo José Soeres Mendes
Com bandeiras, galhardetes, escudos, festões, arcos triunfais, muita verdura, apoteoses de flores, tapetes de juncos e de espadanas, tudo profusamente espalhado por todas as ruas e praças da Vila, iluminações colgaduras nas janelas à passagem de cortejos, foguetes, filarmónicas tocando, fogos de artificio, banquetes, etc., no dia 11 de Outubro de 1891, Abrantes inaugurava a chegado do tão precioso liquido à Vila.
Das várias descrições sobre “A FESTA DA ÁGUA”, as que melhor reproduzem o que se passou em 1891 encontram-se no livro “LANÇANDO AO VENTO… No Concelho de Abrantes”, publicado pelo Coronel Joaquim Maria Valente em 1963.
No livro por si editado, apontamentos de duas décadas (1885/1905), o Coronel Valente regista assim os acontecimentos: “Com toda esta lustrosa companhia Joanes Forte sai da fresca Abrantes...”
“É claro que isto da fresca Abrantes no século XVI é aroma de poesia da responsabilidade de Camões, que provavelmente nunca visitou Abrantes, ou se visitou foi em dia de chuva ou então se foi em dia de sol não viu bem, o que não é de admirar visto ele ter sido cego de um olho, não se sabendo todavia se do olho direito se do esquerdo.
Largo Dr. Ramiro Guedes - Coreto
O que é certo é que a que foi Notável Vila, magnifica¬mente situada, sob o ponto de vista da salubridade, na extremidade de uma extensa colina de apreciável altura, bem aquecida pelo sol e varrida pelos ventos em todos os quadrantes, dotada já de uma rede de esgotos domésticos, padecia de um notável e secular flagelo — a escassez de água — sobretudo de água potável, remediado em parte pela existência de cisternas, que armazenavam a água da chuva caída nos telhados dos edifícios.
Tal armazenamento tinha vulto notável nas cisternas do Castelo, reduto de defesa da Vila como antiga praça de guerra.
Praça Barão da Batalha
O abastecimento diário, sobretudo de água potável, da população, era feito principalmente por mulheres, que à cabeça transportavam bilhas com o precioso líquido das fontes de S. José e de Vale de Roubam, existentes na base da colina.
Cada bilha com tal água custava um vintém, equivalente hoje pelos menos a l$20, seja cerca de $08 por litro de água ou 80$00 por metro cúbico, supondo que tivesse a capacidade de 15 litros.
Uma mulher não podia transportar por dia mais de cinco ou seis bilhas.
Tal preço talvez sirva de justificação à secular quadra com que Abrantes fora mimoseada através dos tempos:
Abrantes é mui boa terra
Dá de comer a quem passa,
A quem não leva dinheiro
Nem água lhe dá de graça.
Fica assim justificado o grande júbilo da população da Vila quando o Governo do país resolveu fazer um abundante abastecimento permanente e domiciliário de boa água, por intermédio de verba inscrita no orçamento do Ministério da Guerra, visto que a guarnição militar da Vila era também vítima da escassez da água.
Como tal escassez era secular, e mesmo milenária, só uma acção politica de grande importância poderia modificar a situação e dar realidade à frase de Camões.
Foi Avelar Machado, deputado regenerador pelo círculo de Abrantes, o herói da conquista da verba para as obras, e por isso deram brado na região as festas realizadas na inauguração do novo abastecimento, as chamadas festas da água, de que ele foi merecido alvo principal, porque lá diz o rifão: “quem dá é pai”.
General Avelar Machado
Inauguração Busto General Avelar Machado
A captação de água para dentro da Vila de Abrantes efectuava-se no Vale de Râs e era “conduzida por gravidade para um depósito subterrâneo próximo do local de captação, e elevada depois por bombas accionadas pelo vapor de caldeiras alimentadas a lenha.
Vale de Râs: Bomba elevatória de águas - 1891
Vale de Râs: Bomba elevatória de águas - 1950
Vale de Râs: Local onde estava bomba elevatória de águas - Ano 2010
A conduta de elevação, de ferro fundido com juntas de chumbo, terminava num depósito de alvenaria construído no Castelo, em sítio próximo do parque coberto do material de artilharia, de nome Papa Feijão, mas de cota topográfica um pouco mais elevada que a de tal edifício.
Castelo - Depósito de água (NEG CVD)
Nas praças principais foram instalados marcos fontenários de ferro fundido com torneiras de pistão.
A rede de distribuição era também de ferro fundido, sendo de chumbo os ramais para os edifícios”.
Se o herói da “FESTA DA ÁGUA” foi Avelar Machado, cujo busto foi mais tarde colocado numa das praças de Abrantes, não podemos esquecer Solano de Abreu, um político que militando em partido diferente (1) se associou desde a primeira hora ao evento num gesto de amizade e dedicação ao povo de Abrantes.
(1) – Avelar Machado, Partido Regenerador/Solano de Abreu, Partido Republicano
Datas importantes: Março, 12 de 1890, Câmara Municipal de Abrantes requer ao Governo elaboração do projecto e orçamento para obras e abastecimento público à Vila. Outubro, 25 de 1890 é firmado contrato entre a C.M.A e o Governo para a execução das obras de Abastecimento de água a Abrantes.
Em itálico: Do livro - Lançando ao Vento no Concelho de Abrantes – Coronel Valente – 1885/1905 – Edição do Autor 1963 – páginas 63/64/65/66/67.
Fotos: AHCA, CVD, JALF, JMOV.
2 comentários:
Caro Sr. JOSÉ MANUEL D'OLIVEIRA VIEIRA,
Parabéns pelo seu blog sobre Abrantes, minha terra de eleição, mas de onde não sou natural.
Como poderei pertencar aos seguidores deste seu blog?
Cumprimentos
Giuseppe Pietrini
giuseppe.pietrini@gmail.com
http://ideiasperegrinasoutalveznao.blogspot.com
Muitos parabéns pelo blog, muito interessante.
Quanto ao Dr. Solano de Abreu, nunca foi republicano, foi monárquico toda a vida e não gostaria muito que, depois de morto, lhe mudassem as convicções.
Enviar um comentário