Sabe-se que a Igreja de S. João "Bautista" foi pensamento e obra da Rainha Santa Isabel, que achando-se com El Rei D. Diniz em Abrantes, no dia 24 de Junho do ano de 1300, aqui mandou edificar uma ermida ao precursor do Messias, por ser esse o dia em que a Rainha entrou na então Vila de Abrantes.
Sabemos que no dia 8 de Agosto de 1385, D. João I, antes de partir para a batalha de Aljubarrota, assistiu à missa na Igreja de S. João Batista e encomendou o sucesso da sua batalha ao Padroeiro desta Igreja.
O que muitos abrantinos não sabem é que após a vitoriosa batalha, D. João I, regressou a Abrantes e na mesma Igreja deixou uma imagem de São João Batista.
Na “Memória Histórica da Notável Vila de Abrantes” (a), é referido: a imagem do Santo não existe hoje.
Fascinado pela estatuária como elemento figurativo e objecto de culto, sabendo da existência de duas imagens de São João na referida Igreja, sabendo a origem da que se encontra no altar-mor, faltava saber a génese da segunda imagem que por estar em local pouco acessível e visível, era desconhecida dos abrantinos.
Graças à realização do maior evento de Arte Sacra, realizado em Abrantes, na Igreja de S. João, de 13 a 20 de Maio de 2007, onde foram expostas alfaias sagradas, estatuária, pintura, retábulos etc. etc., foi possível ver de perto a famosa imagem de S. João Batista, mandada retirar do nicho onde se encontrava, pelo saudoso Padre Doutor Francisco António Rosado Belo.
Despida dos adereços originais e a necessitar de restauro, ainda assim, depois de preparada, a imagem de S. João Batista deixada em Abrantes pelo Rei D. João I, por muitos considerada desaparecida, ai estava, e foi colocada à entrada da Igreja convidando os visitantes a ver a “Exposição de Arte Sacra” (fig. 1).
Finda a exposição, e porque o São João necessitava de um profundo restauro foi a imagem para a cidade de Tomar, onde sofreu várias intervenções técnicas na Oficina “Regra de Ouro”, Sociedade de Restauradores Ldª., o que fez adiar mais uma vez este artigo que penso vir a causar polémica.
Durante a intervenção de restauro, ficaram os técnicos surpreendidos por apenas o “corpo da estátua” apresentar os característicos buracos do bicho da madeira e a “cabeça” que devia apresentar os mesmos indícios encontrava-se imaculada.
Mais surpreendidos ficaram os técnicos de restauro quando se aperceberam que a “cabeça” do São João era em “pedra”, caso raríssimo na estatuária antiga, religiosa.
O corpo em madeira de origem desconhecida e que se diz ser do século XVI/XVII, poderá ser do Século XIV e ser esta a imagem que D. João I deixou na Igreja de São João Batista em Abrantes, no ano de 1385.
A haver duvidas sobre a imagem, “Jorge Cardoso (1606-1669), autor do Agiologio Lusitano dos santos, e varoens illustres em virtude do Reino de Portugal, e suas conquistas…” (fig.2), a páginas 468, diz-nos: “Pelo que tornando vitorioso (Batalha de Aljubarrota), foi dar graças à dita Igreja (São João Batista), deixando nela o seu retrato (em sinal de troféu), na devota imagem do Santo, que mandou esculpir de pedra, na qual em três partes do seu diadema tem as quinas de Portugal.” (b)
Consultados, “ Título das Imagens”, “Tombos, Inventário e Róis de Bens Móveis e Imóveis” referentes à Igreja de São João, foi possível verificar a existência da Imagem de São João, uma bandeira com seu pé de prata, uma bandeira de prata, um cordeiro de prata e respectivo resplendor (diadema) de prata (c).
Feitas pesquisas nos locais onde eventualmente poderiam estar os adereços originais de S. João Batista, concluiu-se que além da estátua, a bandeira de prata é a única peça original que existe (d).
Quanto à cabeça de pedra, inserida no corpo da estátua (em madeira) de S. João Batista ser o retrato de D. João I, a crer pelo que se encontra escrito, o aspecto que teria o Rei (+ ou - 28 anos de idade quando esteve em Abrantes), barba comprida, indiciadora de andar à bastante tempo em campanha, as semelhanças com retratos conhecidos do monarca, tudo leva a crer estarmos perante a verdadeira imagem de S. João Batista e a cabeça ser o verdadeiro retrato de D. João I (fig. 3/4/5).
Análises técnicas de datação, historiadores e arqueólogos, mais do que eu, não académico, poderão confirmar a suspeita de ser ou não esta a imagem deixada por D. João I em Abrantes no ano de 1385 (Século XIV).
(b) Biblioteca Nacional – versão digitalizada que pode ser encontrada em: http://purl.pt/12169.
(c) Biblioteca da Câmara Municipal de Abrantes – AHCA/ISJ/F/001, Livro 1, pg.8 v. e 9f., ano 1730; AHCA/ISJ/F/001, ano 1845, cx. 1 Doc.2.
(d) Agradecimentos ao Cónego José da Graça, pelas facilidades concedidas, na pesquisa das alfaias sagradas.
(e) O restauro do S. João, com corpo de madeira e cabeça de pedra, ficou em 3.260,00 €.
2 comentários:
Extraordinário artigo. Excelente para reavivar memórias da ligação de Abrantes a Aljubarrota.
pena que este restauro deixe muito a desejar... algo que infelizmente tem sido muito recorrente na Arte Sacra do nosso Pais...
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