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O SENHOR JOSÉ PÉRES (ZÉ POVINHO) UMA FIGURA DE ABRANTES!

Por: José Manuel d’Oliveira Vieira
(Autor artigo publicado "Jornal Alferrarede" Nº 273Jul2008)
No “Café Bilhar”, há mais de quarenta anos, ouvi falar pela primeira vez do “Zé Povinho”, de José Peres e ter sido esta figura de Abrantes inspiração para Rafael Bordalo Pinheiro construir tão genial boneco.
Quem passa na Rua Dr. Bernardino Machado (rua que vai da Câmara ao Café Bilhar), antiga “Barroca da Praça” (1), não imagina que ali viveu o senhor José Peres (Zé Povinho).

Rua Dr. Bernardino Machado "Antiga Barroca da Praça"

Na “Barroca da Praça” tinha José Peres a sua casa, alojamento para uma charrete, respectiva mula e um criado.
José Peres vivia dos seus rendimentos e da sua casa saia ele para a sua vida na charrete conduzido por um serviçal. Homem simpático, um tanto baixo, atarracado e dava nas vistas por usar colete e jaqueta cujos botões eram libras, libras ouro, autênticas, de cavalinho, e abundante corrente de libras ligada ao seu relógio também de ouro.
Tendo aparecido na arcada do Terreiro do Paço com tal indumentária foi visto pelo ainda não ultrapassado grande caricaturista que foi Rafael Bordalo Pinheiro, que o caracterizou com o título de “Bezerrinho de Ouro” (2)
.

O ZÉ POVINHO NA SUA FORMA MAIS PECULIAR

Raphael Bordallo Pinheiro no seu atelier nas Caldas da Rainha
No tempo em que foi descoberto por Rafael Bordalo Pinheiro, teria este cidadão da então Vila de Abrantes 45/48 anos de idade.
Perspicaz, Rafael não perdeu a oportunidade de passar para o papel (1875) (3) aquela que viria a ser a figura mais popular de Portugal, ainda hoje dada a gozos mundanos.
Quanto a ser de Abrantes e ter residido na “Barroca da Praça” (Rua Dr. Bernardino Machado), parece não restar a mínima dúvida.
Apontamentos recolhidos na Vila de Abrantes nos anos 1885/1905 (2) fazem referência a quatro figuras sociais. Entre elas está o senhor José Péres que o genial artista da Caldas da Rainha caricaturou como Zé Povinho.
Continuando a suscitar duvidas quanto ao facto do “Zé Povinho” ter sido inspirado numa figura de Abrantes, em 1956, na Sociedade de Belas Artes, o jornalista e escritor Sr. Dr. Luís de Oliveira Guimarães declarou haver fortes indícios para a existência de um modelo o qual teria sido criada num homem de nome José Peres de Abrantes.
De facto, José Peres era um proprietário natural de Abrantes e morreu no dia 30 de Outubro de 1900 com 73 anos de idade. No livro de enterramentos Nº 8 que se encontra arquivado no A.H.C.A., sob o número 115 consta: no dia 31 de Outubro pelas nove horas da manhã deu entrada no seu jazigo erecto no Cemitério público da Nossa Senhora da Conceição da Notável Vila de Abrantes, José da Fonseca Peres (4).

Página 52/53 Livro 8 enterramentos cemitério Villa de Abrantes (Arquivo Municipal Eduardo Campos)

Jazigo de José da Fonseca Peres - Abrantes

Registadas ficaram algumas histórias protagonizadas pelo senhor José Peres: … o pagamento da portagem da ponte sobre o Tejo – Rossio ao Sul do Tejo… e …Judas estourando na Praça do Concelho quando na Igreja de S. João tocavam os sinos anunciando a Aleluia….
Pelas histórias que dele se conta, José Péres era pois um ratão de gosto muito engraçado, inofensivo e que muito divertia com as suas ratices.
Não havendo prova a contrariar esta teoria, tudo leva a crer ter sido este rico proprietário, cidadão Abrantino, de nome José da Fonseca Peres, a figura inspiradora para a criação do “ZÉ POVINHO”.

O primeiro ZÉ POVINHO - 1875 - I O caricaturista Ferreira Ldª Editores 1915

Quanto à localização exacta da residência de José Péres na Barroca da Praça (Rua Dr. Bernardino Machado), poderá haver dúvidas. Uma planta de Abrantes do ano de 1817 indica ter havido duas casas de grandes dimensões nesta rua. Pela abastança demonstrada por este senhor, a maior das casas e grande quintal localizava-se no local onde hoje se encontra o Café Bilhar. Assim sendo, poderá ter sido este o lugar (confluência da rua da Barroca com a rua da Barroca da Praça) de residência do nosso conterrâneo José da Fonseca Peres!
(1)O topónimo Barroca da Praça é já atestado num documento de 1441 (AHCA, P,20). “Barroca da Praça”, por ali ter existido uma ravina.
(2)Lançando ao Vento… no Concelho de Abrantes – 1885/1905 do Coronel Valente – Edição do Autor.
(3)O imortal “Zé Povinho” nasceu em 1875 na revista “Lanterna Mágica”.
(4)Livro nº 8 – Enterramentos no Cemitério de Abrantes (AHCA, P, 52,53).
Figura: Zé Povinho retirada da Revista Álbum “Rafael Bordalo Pinheiro” – Ano 1915.

À VONTADE DE SEU DONO

(Publicado no "António Maria" 09/09/1880)