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“ABRANTES E OS ABRANTINOS”



“ABRANTES E OS ABRANTINOS”
MANUSCRITO DO CAPITÃO ARTUR ELIAS DA COSTA
Por José Manuel d’Oliveira Vieira
    Em dezembro de 2016 publiquei neste Blog (COISASD’ABRANTES), um pequeno artigo com o título “ABRANTES - NA PISTA DA COMUNIDADE JUDAICA 1383/1493”. No mesmo artigo, lembrava o Capitão de Artilharia Artur Elias da Costa (1894/1956), o seu nascimento, as origens judaicas, a carreira militar (1916/1946), as condecorações bem como alguns dos trabalhos publicados (1928/1932/1935/1936).
    Após lhe ter sido instaurado um “Processo político - 1932” é colocado numa Unidade de Artilharia em Abrantes. Dado à escrita, sua paixão, Elias da Costa, passa a colaborar na imprensa local e contribui para a Monografia do Concelho de Abrantes.
    No “Arquivo Municipal Eduardo Campos”, podemos ver e consultar o manuscrito, “Abrantes e os Abrantinos – 1948”, do Cap. Elias da Costa.
    Nos cinco tomos do manuscrito: “A Geografia – Tomo I”, “A História – Tomo II”, “A População – Tomo III”, “A Linguagem – Tomo IV” e “A Economia – Tomo V”1, podemos ver como eram os anos 40/50 do século passado, o que pensavam as elites políticas abrantinas e a razão da não publicação em livro, “Abrantes e os Abrantinos” do Capitão de Artilharia Artur Elias da Costa.
    Na consulta e notas que retirei do manuscrito transcrevo excertos do “Prefácio - 1948” e o texto integral do seu “Testamento particular – 1951”:
    “Prefácio - 1948” …” São múltiplas e variadas as causas da paralisia dos órgãos propulsores do seu progresso. Uma delas é que a população urbana está dividida em parcialidades inimigas, e cairá inevitavelmente em ruína insanável, se um pensamento mais generoso, inspirado por um ideal de justiça mais elevado não vier conciliar as aspirações de partidos que parecem irredutíveis2.
    Os ingénuos bairristas cá do burgo, que preferem dormir sobre o mole travesseiro da deixa-correr, não gostam que se fale da sua terra com uma objectividade que não é afectada pelas conveniências políticas, nem tão pouco pela necessidade de tomar em consideração as amizades ou inimizades criadas durante o intenso desenrolar de acontecimentos domésticos a que nos estamos referindo”.
    …” Raras vezes na minha vida senti a necessidade de mudar de plano, mas verifiquei logo que o projecto de reunir os aproveitáveis tinha inconvenientes graves. Ser demasiado lento não era o menor deles”.
    “Testamento particular – 1951”3 - No dia 25 de Fevereiro de 1951, pelas 20h30m, estando a meio do jantar, fui procurado pelo Exmº Snr. Dr.Emílio Salgueiro, que me convenceu de que efectivamente a cidade de Abrantes não tinha interesse nenhum no meu manuscrito intitulado “Abrantes e os Abrantinos” de 25 e cinco volumes (fora os do índice e prefácio).
    Pediu-me para retirar o livro que trata de questões políticas, e comprimir todos os outros de modo que ficasse obra de leitura possível. O que eu apresentava não servia para nada, porque não era comercial nem legível. Era um oceano exaustivo de pormenores a cujos rigores o grande publico não quereria aventurar-se. A cidade me ficaria grata se eu fizesse um resumo, dando guerra ás dissertações não menos tediosas do que escusadas, cujas espécies só poderiam interessar a um pequeno número de estudiosos, só poderiam aproveitar com circunspecção à élite cultural do país. “Esto brevis et placebis”, sê breve e agradarás.
    Disse muitas mais razões aceitáveis, eu fiquei convencido, e agradeci; e como estou sempre à espera duma recaída fatal, apressei-me a redigir esta minha última vontade: o manuscrito sobre “Abrantes e os Abrantinos”, que eu escrevi em 1948 para oferecer ao Exmº Snr. Dr. Emílio Salgueiro, em 1950 para brindar a cidade de Abrantes, e de hoje em diante, na minha longa convalescença continuarei a relação, será oferecido ao concelho de Abrantes por intermédio da sua Câmara Municipal.
    É esta a minha última vontade, que desejo seja integralmente cumprida.
    Só me resta dizer que eu procurei servir os Abrantinos o melhor que posso e sei; foi o excesso de zelo que estragou tudo; quis fazer óptimo, saíu inimigo do bom.
Saúde e felicidades a todos.
Abrantes, 25 de Fevereiro de 1951
Artur Elias da Costa
Cap do Q.Rf.
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No Arquivo Municipal Eduardo Campos, o manuscrito “Abrantes e os Abrantinos” do Capitão Artur Elias da Costa, continua ainda hoje a ser a melhor fonte de pesquisa das vivências abrantinas dos anos 40/50 do século passado. É, pois, desse passado, que recolhi os apontamentos e imagens:
    (I) ABRANTES – PEGO: O LENÇO DE ALGODÃO/RAPARIGAS NOVAS/MULHERES VELHAS4
    A maneira de por o lenço de algodão na cabeça é mais interessante no Pego.
    Nesta freguesia as raparigas novas dobram-no por uma diagonal, ficando assim com três pontas.
    Destas, a do angulo reto fica nas costas; as dos ângulos agudos passam por trás da nuca e por baixo da ponta livre e vêm atar graciosamente no alto da cabeça que fica assim apertado na testa à moira. É de preceito ficarem as orelhas de fora para se verem bem os brincos.
    As mulheres velhas, ao princípio, dão-lhe o mesmo jeito, mas as pontas dos lados cruzam por baixo do queixo e vão atar sobre a nuca, por cima da ponta do angulo reto. Há uma terceira maneira de por o lenço, que lembra fortemente o jeito que as mulheres gregas e romanas davam à calântica (lenço usado pelas gregas e romanas, que se enrolava à cabeça em forma de cinta e cujas pontas caíam sobre os ombros) conste muito simplesmente em deitar o lenço por cima da cabeça à qual se cinge graciosamente, caindo uma ponta para trás e duas sobre os ombros, bastante negligentemente, para não amarrotarem. Eu ainda estou para saber como é que o lenço, assim descuidado para os ombros em vez de lhes cobrir o toutiço (parte posterior da cabeça, nuca, cachaço), se aguenta sem escorregar (no álbum Abrantino pus quatro desenhos onde se dá conta destas particularidades).
*
(II) ABRANTES - PEGO: OS CARVOEIROS E A CERTÃ4
    A certã é a peça essencial do equipamento do carvoeiro pegacho e tanto pode ser adquirida numa feira, como ser feita de encomenda em qualquer latoeiro numa feira. É um utensílio característico que denuncia logo o pegacho no meio dos numerosos camaradas que trabalham na carvoaria por esse Alentejo abaixo.


1Manuscrito “Abrantes e os Abrantinos” – Costa, Artur Elias, maço 00, pág. 1.
2Manuscrito “Abrantes e os Abrantinos” – Costa, Artur Elias, maço 00, pág. 69.
3Manuscrito “Abrantes e os Abrantinos” – Costa, Artur Elias, maço 00, pág. 5.
4Manuscrito “Abrantes e os Abrantinos” – Costa, Artur Elias, maço 03, pág. 50 a 52.

NOTA: PARA QUANDO A PUBLICAÇÃO EM LIVRO DO MANUSCRITO “ABRANTES E OS ABRANTINOS” DO CAPITÃO ARTUR ELIAS DA COSTA, AUTOR DE TRABALHOS SOBRE ANTROPOLOGIA, FILOSOFIA, MATEMÁTICA, TEMAS MILITARES…

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