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ABRANTES - CORREIO DO REINO

CORREIO DO REINO – POSTA DE ABRANTES 1808/1817

Por José Manuel d’Oliveira Vieira


 ABRANTES MILITAR         
                A história dos correios em Portugal começa com D. Manuel I no ano de 1520 e Luís Homem o seu primeiro Correio-Mor. Entre regime de concessão, publicação da primeira estrutura do serviço de correio, promulgação de privilégios dos Mestres de Posta, Convénio Postal com o Grão Mestre da Posta Inglesa, Convénio Postal com Espanha, chegamos ao ano de 1798 com a Coroa a reivindicar a exploração dos serviços de correio e o estabelecimento da “Posta de Abrantes 1802”.
         CORREIO DO REINO – POSTA DE ABRANTES – 1802/1817, é mais um fragmento da história militar de Abrantes, tido como essencial para o desenrolar das operações militares entre unidades em constante mudança no terreno.
            O estabelecimento da “Posta para a comunicação do Exército na Vila de Abrantes” é anterior à Guerra Peninsular e tem como data conhecida o dia 5 de Outubro de 1801, aviso com data de 24 de Dezembro de 1801 (doc. 609), assinado por D. João de Almeida Mello e Castro e relação elaborada por António Joaquim de Moraes com data de 12 de Janeiro de 1802. No documento consta o nome de Manuel Gadanho de Abrantes como dono da “Posta” e um tal Bexiga e Peralta de Paialvo=freguesia do concelho de Tomar, dono(s) das 4 bestas que estão na “Posta de Abrantes” (fig.1)
fig. 1 – (doc. 609) Manuel Gadanho - dono da Posta de Abrantes – Ano 1802
            Já na Guerra Peninsular, Abrantes, foi um importante centro de apoio logístico das tropas luso-britânicas: grandes depósitos de víveres em Abrantes e Rocio ao Sul do Tejo; paióis de armas e munições em Abrantes. Acantonamento de tropas: Hortas, Chainça, Estrada Vila de Rei, Rocio ao Sul do Tejo e Abrantes. Na transmissão de mensagens é já conhecido o Telégrafo visual, instalado na torre do Castelo de Abrantes (ver neste blog: telégrafo de Ciera em:
http://coisasdeabrantes.blogspot.pt/2011_03_01_archive.html
            Não menos importante para o desenrolar das operações militares durante um determinado período, foi o serviço de “Posta” (correio geral e do exército), estabelecido em 1808 na então Vila de Abrantes.
            Para melhor compreender a descrição dos documentos que deram origem a este artigo e a relevância que o serviço de “POSTA” de Abrantes teve nas invasões, saibamos o que é uma Posta e um Postilhão: Posta - Estação de cavalos, colocada de distância a distância para serviço dos viajantes: cavalos de posta. Estação para muda de parelhas de tiro, de diligências e outros veiculos, ou para serviço dos viandantes: descansar na posta; apearem-se na posta para almoçar. Postilhão – Condutor no serviço da posta. Homem empregado no serviço do correio, para transportar, a cavalo e com rapidez, correspondência ou noticias entre várias localidades. (Grande Enciclopédia Portuguesa e Brasileira - pg. 919/922)
            Ano 1808 - Dezembro 13 (doc.2650): o Correio Geral informa D. Miguel Pereira Forjaz, Secretário dos Negócios Estrangeiros e da Guerra, ter o Corregedor de Tomar mandado estabelecer na Vila de Abrantes seis bestas de “Posta” conforme este tinha determinado. Dezembro 27 - (doc.2654): o Juiz de Fora de Abrantes, José de Macedo Ferreira Pinto, além dar conhecimento a D. Miguel Ferreira Forjaz, sobre a situação do estabelecimento da “Posta” do Penhascoso e da má qualidade das bestas que podiam satisfazer os fins da “Posta”, faz saber das dificuldades em aboletar o Regimento de Infantaria Nº 2 na Vila de Abrantes. Por ser um documento que faz referência ao nome daquele que viria a ter como quartel permanente o Convento de S. Domingos em Abrantes no longínquo dia 3 de Junho de 1918, transcreve-se parte do mesmo: “O Regimento de Infantaria Nº2 chegare a esta Vila no dia 14 do corrente, e não sendo bastante para sua acomodação a parte dos Quarteis que àpreça se repararão, foi forçoso aboletalo pelas cazas da Vila; e sendo necessário na paragem das Tropas Britanicas acomodar os Oficiais pelas cazas particulares, não fica havendo cómodos quentes para todos, e para os Oficiais avulsos de diferentes corpos que transitam por esta Vila, alem do incomodo dos moradores; e sendo verosímil que continuem as paragens (!): pareceme do meo dever propor a V. Exª estas circunstancias, para que sendo possível, sem me opor as ordens de S. A. R., o Regimento Nº 2, havendo de demorarse, se acantonase na Vila do Sardoal ate acabarem as paragens, ou aquella providencia que V. Exª melhor parecer a beneficio da Tropa e do Povo”.
            Ano 1809 – Janeiro 7 (doc.2653): […] tendo-se estabelecido em Abrantes a “Posta Militar” de que é Mestre Manuel Xavier da Golegã, este exige o pagamento mensalmente, e se lhe devem 48#000 no fim de Dezembro. […]  por ordem do Brigadeiro Francisco da Silveira Pinto se tinha estabelecido mais outra Posta no sítio de Penhascoso, entre as Postas de Abrantes e venda Nova, e isto, por serem muito ásperos os caminhos por este sítio e extensa Carreira de Abrantes e Venda Nova. Maio 13 (doc. 2666): Nesta data, o Diretor dos Correios do Reino, José Barreto Gomes, executando uma ordem de D. Miguel Pereira Forjaz, envia a este, um mapa de todas as “Postas” que se acham estabelecidas nas províncias do norte e do sul.          Para a Província do Sul (carreira de Castelo Branco) existiam à data as “Postas”: Azambuja, Santarém, Golegã, Abrantes, Penhascoso, Venda Nova, Perdigão, Castelo Branco (fig.2). Setembro 14 (a): As instruções para as Postas do Exército (1809) determinavam normas aos Postilhões=cavaleiros=mensageiros. O mais antigo documento postal da época foi descoberto no Ministério dos Negócios Estrangeiros e Guerra pelo estudioso e investigador Godofredo Ferreira. Nesse documento constata-se ter o correio João da Costa Moreira partido para Badajoz a 14 de Setembro de 1809, levando consigo duas cartas entregues em Lisboa no mesmo dia 14 de Setembro, por um membro do exército inglês – “Delivered him two letters at twelve o’clock. Lisbon, 14 Sept. 1809”. Estas mesmas cartas foram entregues em Badajoz a 16 de Setembro, conforme anotação manuscrita:“Received the letters for the Company General. Badajoz 16 September 1809”. Finalmente e já no regresso, entrega em Estremoz uma carta, para Abrantes.“ Received the letter for Abrantes 9 o’clock A. M. Setp, 17, 1809” - “Delivered at Estremoz 17 September 1809” (fig. 3). Novembro 2 (doc.2687): 97#600 Rs por dia despendia a Real Fazenda com as “Postas Militares” de todo o Reino. Com propósito de reduzir despesas, sem comprometer os despachos importantes, a “Posta de Abrantes” passou a ter 6 dos 10 cavalos que possuía.
fig. 2 – (doc. 2666) Abrantes no Mapa de Postas Província do Norte 

fig. 3 – “Parte” com cartas entregar destinatários
            Ano 1810 – Janeiro 3 (doc.1793):   Do Palácio do Governo, D. Miguel Forjaz, restitui a José Barreto Gomes, Diretor dos Correios do Reino a informação que lhe mandou o Diretor das Postas do Exército sobre o estado das que existem de Elvas para Abrantes e sobre o estabelecimento do correio diário entre Elvas e Abrantes. Janeiro 9 (doc. 1801): Uma cópia do Plano para a execução do correio diário entre a Praça de Abrantes e Elvas, com onze artigos é enviado por D. Miguel Pereira Forjaz a José Barreto Gomes, com indicação deste fazer entrega de uma cópia ao Diretor das Postas do Exército que se encontra em Elvas. Dos 11 artigos que compõem o referido plano transcrevem-se dois: Art.º 1º - Do correio d’Abrantes para Elvas, e de Elvas pª Abrantes partirão as Mallas todos os dias ás 6 horas da tarde. Art.º 7º - Os correios de Elvas Abrantes remetterão com as “Partes” (!) as Gorgetas para os Postilhoens; regulando a 120 reis pur cada Gorgeta (fig 4). Janeiro 10 (doc. 1803): Com Quartel-general em Coimbra o Marechal General Lord Wellington acrescentou ao plano do correio diário Abrantes/Elvas que o mesmo se dirigisse a Coimbra de forma a manter a linha de comunicações. Janeiro 10 (doc. 1804): Ordem do Secretário dos Negócios Estrangeiros e da Guerra D. Miguel Pereira Forjaz, para se conservarem as 6 Egoas, na Posta de Elvas a Abrantes, para as carreiras extraordinárias de militares. Janeiro 31 (doc. 1834/1836):      O Príncipe Regente aprova, manda publicar e imprimir o Regulamento das Postas do Reino. De referir parte do 20.º e último artigo deste Regulamento: […] Mestres de Posta e seus Postihloens são isentos de Recrutamentos Militares, e de todos os encargos Publicos pessoaes, e poderão usar de Armas prohibidas hindo em serviço […]. Outubro 17 (doc. 3363): Em 14 de Outubro, Beresford ordena ao Governador da Praça de Abrantes, José Lobo Brandão de Almeida que se estabeleça na margem Sul do Tejo uma correspondência segura de Postas Militares. Fica responsável pelo estabelecimento das ditas Postas o Ajudante dos Correios Manuel José Raposo de Carvalho.

fig. 4 – (doc. 1801) Plano estabelecimento correio diário Abrantes/Elvas
                Ano 1813 – Janeiro 13 (doc. 3363): José Lobo Brandão de Almeida, Governador da Praça d’Abrantes, atesta que Manuel José Raposo de Carvalho tem estado servindo o cargo de Correio Assistente no impedimento de seu pai neste emprego e foi encarregado “para o estabelecimento das “Postas” militares para, sul do Tejo, como tambem depois da retirada dos Francezes daqui a Thomar” (fig. 5). Março 5 - (doc. 3362):          Devido à idade e falta de vista, o Capitão das Ordenanças e Correio Assistente de Abrantes, José Henriques de Carvalho, requer que o filho Manuel José Raposo de Carvalho o substitua no cargo de Correio Assistente de Abrantes.


fig. 5 – (doc. 3363) Atestado do Gov. Abrantes João Lobo Brandão
            Embora relevantes para a história da “Posta e Postilhões de Abrantes”, outros documentos que tratam do “funcionamento das Postas Militares; pagamentos aos Mestres de Postas; estabelecimento de novas Postas e responsabilidades das mesmas pelo Juiz de Abrantes; pagamento mensal aos Mestres de Postas de Abrantes e Penhascoso; manutenção das éguas do Assento de Abrantes que se encontram ao serviço do Exército para a correspondência do Alentejo; número de bestas e condutores das carreiras de Postas Militares do Ribatejo; representações dirigidas pelos correios e pela Câmara de Abrantes; proposta como devem ser pagas as carreiras das Postas de Elvas para Abrantes”, referentes aos anos 1808/1809/1810/1811/1815, não são aqui mencionados.
          Ano 1817 – Novembro 6 (doc. 4148) – Para finalizar “Posta de Abrantes 1808/1817”, vejamos a informação que o subinspetor dos correios do Reino dá a D. Miguel Pereira Forjaz sobre os assaltos aos “Postilhões” nos sinuosos caminhos do reino: […] o officio incluzo do Correio Assistente de Abrantes com data de 3 do corrente; em que comunica achar infestada de ladroens a estrada por onde tranzita o Estafeta, pedindo eficazes providencias para a segurança do mesmo, e dos objectos que conduz […]
            Posta de Abrantes – locais a considerar: Rua de S. Pedro com as suas cocheiras e ligação à Fortaleza de Abrantes (- provável) ou a antiga Rua do Correio Velho ou Rua do Correio Geral, hoje Rua Cidade Caldas da Rainha (+ provável). Nesta última rua onde se encontrava estabelecido o Correio de Abrantes, há memória de ali terem existido umas importantes cocheiras.
Nota: Todos os documentos sobre a “Posta de Abrantes” (civil e militar) foi consultada no “Europeana”,  “Fundação Portuguesa de Comunicações”, á qual damos os devidos créditos.    
(a)     In Clube Filatélico de Portugal, artigo de Luís Frazão.
           CURIOSIDADES
            O correio assistente de Abrantes guardava para si a importância dos portes das cartas que distribuía bem como o prémio do seguro do dinheiro que enviava para outras terras. Por ser correio assistente, pagava ao correio-mor uma renda, geralmente acompanhado de um presente em géneros. Em princípio facultativo, o presente denominado de “pitança” tornou-se obrigatório. No mês de Abril de 1799, o correio assistente de Abrantes deu de “pitança” ao correio-mor: 3 dúzias de melancias, 3 centos de marmelos, 3 sacos de castanha pilada, 3 centos de peras vergulosas e 1 alqueire de ameixas passadas.        
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            Sem considerações filatélicas (carimbo azul, percurso, franquia), mostramos uma das raras cartas existentes em Abrantes, enviada de Lisboa no dia 6 de Março de 1848, tendo como destinatário o “Administrador do Tabaco em Abrantes”, Sr. João Rodrigues Ferreira, residente no Rossio ao Sul do Tejo.
    
Administrador do Tabaco em Abrantes
POSTILHÕES – ANO 1835/1854
            Neste desenho à pena de Carlos Van Zeller, feito no ano de 1835 mostra um postilhão que faz estalar um longo chicote e transporta diante de si, sobre o garrote da alimária, uma volumosa mala de correio. Atrás, de jaleca, calção e polainas, transportando duas malas segue o condutor do correio.  Embora o desenho seja de 1835, é de crer que o tipo de indumentária destas duas personagens fosse o já usado muitos anos antes. A legenda Govt. Post (Gouverment Post) lembra-nos que Carlos Van Zeller embora filho de pais portugueses, nasceu na Inglaterra e lá viveu quase sempre. (In - Centro de Documentação e Informação da FPC)     
(1854)

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